
O
casal apronta-se para ir à festa, cada um em quarto diferente. Uma festa de
família, um casamento entre amigos, numa localidade próxima. Ele, em sua
magreza, tem que ficar subindo as calças porque o cinto não aperta a cintura e
deixa a calça folgada, insistentemente. A blusa branca, a calça preta em pano
passado.
Ela
veste uma saia pregueada na cintura e solta na barra, pano fino feito cetim.
Blusa de manga, com botões abundantemente enfileirados de cima a baixo. Batom
leve e mais nada no rosto. Olha-se no espelho, pela última vez, mais uma vez.
Um respingo de perfume na articulação de braço e antebraço, no avesso da mão e
na ponta da orelha. Ergue o nariz e tenta colher no ar se não se deixou
exagerar. Confirma seu gosto e dirige-se à sala onde ele a espera com
impaciência. Ao perceber que se demorara além do devido, baixa a cabeça e
comenta alguma coisa sem que se possa ouvir claramente o que seja. Ele se
esquece que está aborrecido e pergunta o que ela teria dito ao que ela responde
com um “nada não”, já risonho.
Ao
chegarem ao local da festa, casa de sítio com amplos alpendres e o espaço
invadido com a música alta e luzes enfileiradas até depois dos limites do
terreiro. As mesas espalhadas parecem todas ocupadas. Ela suspira fundo a olhar
para um grupo de rapazes postos logo adiante. Num olhar, ele a censura e, ao
mesmo tempo, indaga onde poderiam se instalar. Ela, embora sentindo aquele
olhar, minimiza, diz que não veio à festa para ficar sentada, quer dançar.
Puxa-o para o salão onde o sanfoneiro rasga o fole e os dançantes gastam os
sapatos no piso encerado.
Dançam
até cansarem-se. Saem do salão e buscam algum lugar aonde possam conversar e
ficar à vontade. Sentam-se num tronco de árvore afastado do burburinho e
põem-se a conversar. Logo, ela percebe que o lugar ganha movimento e, mais
ainda, movimento de mulheres. Observa que as moças que por ali passam voltam a
agruparem-se adiante e ficam rindo, conversando e a olhar para onde está o
casal. Sem mais nem menos, ela pede a ele a aliança. Ele, a princípio, não
entende. Ela diz que quer, simplesmente, que ele entregue a aliança e vá
conversar com as moças que não fazem questão de esconder o interesse nele.
Afinal, diz ela, elas o estão paquerando desde que saíram do salão de dança.
Ele
entrega a aliança, beija as mãos da mulher e vai ao encontro das moças que
estão logo ali, em pé, falando e sorrindo, ao tempo em que olham para onde o
casal está.
Ela
sai caminhando devagarzinho em direção a casa aonde a festa vai animada.
Encontra-se com alguns conhecidos que perguntam pelo marido. Ela responde que
ele foi a algum lugar e prossegue seu destino. Mais adiante encontra umas
amigas, cumprimentam-se, trocam algumas palavras e aos poucos um grupo maior
está formado. Passam a botar o papo em dia, há muito não se vêem.
Sem
que se dêem conta, as primeiras luzes do dia começam a surgir. Ela olha para
onde havia vindo e não vê o marido e nem as moças que estavam com ele. Resolve
então, ir a busca dele com o objetivo de irem para casa, a festa está quase
terminando e ela não se agüenta mais de sono. Percorre quase todo o espaço aos
arredores da casa e não o encontra. Resolve procurar dentro de casa e nada.
Quando
já estava quase decidida a tomar o caminho de casa sozinha, vê um casal
afastado, bem afastado da casa. Ao se aproximar ela o identifica. Caminha,
então, na direção do casal e chegando ao local, percebe que os dois estão
bastante à vontade em afagos e carícias. Ela para junto e eles nem percebem.
Ela, sem alarme, pega na mão do marido e o puxa para si. Ele também não reage.
Com calma, ela mostra para o dia que está nascendo e diz que está na hora de
irem para casa.
A
moça adota uma expressão de surpresa e desapontamento. Sem entender nada, vê
como ele cede ao convite da mulher que acabara de chegar ali. Olha para as suas
mãos no momento em que ela repõe a aliança no dedo do marido. Desesperada,
corre aos prantos em direção a casa. O casal vira-se de costas e se vai
impassível.