
O
apartamento é um cenário bastante confuso: objetos pessoais e roupas se
espalham por todos os lugares. Esta situação provoca inquietação,
principalmente, pela obrigação que daí advém de por aquilo tudo em ordem. Esta
obrigação é contrariada pela indisposição para iniciar esta tarefa. A aflição
provocada por estes dois pontos em contrariedade tem a força de provocar uma
ação que parece fora de qualquer controle, uma vontade desmedida de sair dali
imediatamente. Olha ao redor, apanha uma camisa e uma calça, entre as que estão
espalhadas por sobre os móveis, põe um tênis sem cadarço e sai batendo a porta.
De primeiro instante, não reflete aonde deseja mesmo ir naquele momento.
De
repente, vem à lembrança de onde esteve na noite anterior. Não consegue lembrar
com clareza de muita coisa, bebera além da conta. Mas uma imagem é recorrente
em suas lembranças: a casa de Gina, sua ex-namorada. Estivera por lá algumas
vezes com a intenção de falar com ela, mas sem sucesso.
Pensando
nisto, toma a mesma direção. Apanha um ônibus e senta-se próximo a uma das
janelas. Por longo tempo, fica olhando as casas que passam, as pessoas paradas
nos pontos, os outros ônibus e os carros em sentido contrário. Aproxima-se o
seu ponto, dá sinal, o ônibus pára e ele desce sem muita pressa.
De
pé, parado, fica imaginando se deve mesmo ir, já recebera algumas reclamações
da ex-namorada, pedidos para que não fique rondando sua casa.
Começa a chuviscar e, por
falta de uma decisão, acha melhor passar num bar que sabe estar próximo para
beber alguma coisa e poder clarear as idéias. Até que chegue ao bar a chuva
torna-se mais intensa. Corre, tentando proteger a cabeça com a camisa.
Entra
de uma vez, fica a limpar a água da roupa como se pudesse com isto enxugar-se.
Embora chova, o tempo está abafado e quente. Pede uma cerveja para retirar o
amargor da língua. Entorna o primeiro copo e o engole quase de um fôlego só. O
balconista olha-o fixamente, mas sem qualquer expressão. O restante daquela
garrafa ele vai espaçando, encostado no balcão, com o olhar dirigido para fora
como se esperasse alguém.
A
chuva pára, o tempo refresca um pouco. O balconista sai de detrás do balcão e
vai enxugar as mesas e as cadeiras postas na calçada. Ele observa tudo sem
interesse. Enquanto isto, vai ingerindo outras garrafas de cerveja sem se
decidir se vai ou não à casa de Gina. Enquanto pensa isto, vê com incredulidade
que Gina vem na direção do bar. Completa o copo, toma-o de uma vez. Enche
outro, olha atentamente e o repõe sobre o balcão.
Quase
não acredita quando vê que ela se aproxima do bar, por impulso vai ao seu
encontro. Cumprimenta com um sorriso, mas ela parece contrariada. Rosto
fechado, quase não fala com ele. De repente, ela passa a reclamar porque ele
anda rondado sua casa. Ele vai mudando de humor e passa a retrucar com raiva e
a falar cada vez mais alto. Gina pede que ele se acalme, mas isto o deixa ainda
mais irritado. De repente, apanha a garrafa de cerveja e a joga no chão com
violência. Depois disto, sai dali colérico.
Mais
adiante, pára e volta-se para olhar o bar, lembra que não pagou as cervejas,
mas não quer voltar com Gina ainda lá. Pensa que pode ser mal interpretado,
depois, não está mesmo a fim de vê-la novamente tão cedo. Tem sido desprezado,
humilhado mesmo, não deseja mais continuar se sentindo assim.
Mas,
ao voltar-se vê que ela está sentada em uma das mesas dispostas na calçada do
bar e um homem se aproxima dela. Toma interesse e fica observando a cena. Logo
em seguida, o homem senta-se também à mesa. De longe, não dá para saber o que
conversam. Daí, pensa que deve voltar para pagar a conta e, quem sabe, poder
observar de mais próximo. Neste instante, os dois levantam-se e saem dali
devagarzinho.