Regina
amanhece sentindo-se indisposta, e acha melhor procurar um médico. Depois do
café, ao invés de ir para o trabalho, vai ao Centro Médico de Botafogo. O
mal-estar provoca calafrios, náuseas e indisposição.
Aproxima-se
do balcão de atendimento e pede para marcar uma consulta com o clínico geral.
Enquanto aguarda ser atendida, apanha uma revista bastante atrasada e fica
paginando sem desejo de ler, apenas olha as imagens de personalidades que se
exibem numa destas ilhas cenário. Ao seu lado, uma senhora que também aguarda a
vez parece agitada. Diz ela que há várias noites não consegue dormir direito
por causa de barulhos que a incomodam no apartamento um andar acima do que ela
mora.
Conta
que o barulho parece, num momento, ser de pessoas que correm como que uma
perseguindo a outra. Noutros momentos, parecem rolar pelo chão, derrubando
cadeiras e outros móveis. Tem sido assim há dias: inicia uma hora da manhã e
vai até próximo de cinco e meia da madrugada. O pior é que os porteiros do
prédio já foram avisados, mas não tomam conhecimento. Pior ainda, o dito
apartamento está vazio, os donos estão viajando para a Europa e não retornam
tão cedo. A mulher reclama que está se sentindo descompensada e que não sabe
mais o que fazer. Sua última saída foi procurar o auxílio médico, entende que,
tomando um remédio mais forte para dormir, não será mais afetada pelo problema.
Enquanto
escuta aquela história, Regina vai virando as páginas da revista sem se deter
muito em qualquer uma delas. De vez em quando para e ergue os olhos, para
tentar observar as pessoas que parecem prestar atenção naquela senhora idosa
que fala e gesticula com nervosismo. Quanto mais ela se percebe observada, quanto
mais gente se chega próximo para ouvir seus relatos, mais a senhora dramatiza
sua situação.
Há
quem sorria do modo dramático com que ela se expressa, há quem demonstre
indignação e assombro, e parecem questionar como podem incomodar o sono de uma
pessoa idosa que está precisando agora descansar na vida? E os tais porteiros,
que não descobrem ou não querem tomar providências com aquela situação, onde
estariam? Há quem seja indiferente e continue lendo aquelas matérias das
revistas ultra ultrapassadas, como se novidade fossem. As reações são as mais
diversas. De um momento para o outro, alguém é chamado para receber
atendimento, e seu lugar é ocupado por alguém que acaba de chegar, ou aguardava
em pé um assento.
Regina,
com seu mal-estar, não pede a Deus que seja logo atendida, porque não sabe
quanto tempo aguentará se sentindo daquele modo. O tempo passa lentamente. Um
suor frio percorre sua espinha e borbulha a testa. Os lenços de papel já não
dão conta. Mesmo assim, a boca ressequida e amarga exige que Regina vá ao
bebedouro e engula copos e copos de água. Como não consome bebida alcoólica,
sabe que não é ressaca, mas as pessoas que a observam parecem admiradas de
tanto vê-la beber água.
A
atendente comunica à senhora que contava seu drama que, quando sair o paciente
do consultório três, ela será atendida. A mulher confirma com a cabeça e, ainda
gesticulando, ergue-se da cadeira, e, como se necessitasse ainda da audiência
que a circunda, comenta, para finalizar, que, se o sonífero não der resultado,
vai apresentar queixa na policia. Ainda mais que parece emanar do tal
apartamento um cheiro muito forte e, parece, alguma fumaça.
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