domingo, 12 de setembro de 2010

DE FORTALEZA A TERESINA, COM ESCALAS.



        Tomo o avião em Fortaleza com destino a Teresina, PI. Em quarenta e cinco minutos estarei chegando ao meu destino, promete, pelo serviço de som da aeronave, o comandante. Enquanto o avião se dirige para a pista de decolagem, cochilo levemente. Acordo com uma das comissárias de bordo tentando explicar a uma senhora, sentada na poltrona à minha frente, que nos assentos que coincidem com as saídas de emergência não é permitido por a bagagem de mão. A mulher finge não entender aquela observação e prende a sua bolsa ao corpo. Começa, então, um e vir de comissários revezando-se na tentativa vã de convencer a resistente senhora a largar a bolsa. Surpreendo-me quando, num gesto brusco, uma das comissárias arranca abruptamente a tal bolsa das mãos da mulher e a põe no bagageiro acima de sua cabeça. A seguir, percebendo que todos no avião estão com a atenção voltada para a cena, cumprimenta-nos com um gesto de cabeça e sorri, como se houvesse conquistado uma importante vitória ou nos prevenisse.
          Todos retornam as suas posições de inércia e indiferença. O avião decola, finalmente.
       Pego um exemplar de uma revista de bordo e vou folheando. Em textos bilíngües, a revista vai-me apresentando cidades da Colômbia e vou-me deliciando com matérias que me remetem à “cosmopolita Bogotá, a romântica Cartagena, a paradisíaca San Andrés (no Caribe) e, finalmente, a Letícia, uma pequena jóia incrustada na Amazônia.”
          Bogotá me acolhe com seu clima gostoso de apenas 18 graus. A cidade vencedora de uma fase de perturbações violentas provocadas pelas guerrilhas e pelo tráfico de drogas oferta-se como uma promessa de prazer ao turista. Capital da Colômbia, Bogotá é uma cidade charmosa e sedutora. Ruas limpas, seguras enfeitam-se de vida nas cores das vestimentas de seus transeuntes e da vibração de alegria que parece emanar de cada pessoa: nativos e estrangeiros. Chamam-nos a atenção o teleférico no centro, os artistas em apresentações de rua e uma igreja de sal. Por entre os casarões originários dos séculos 17 e 18, cerca de 58 museus e 62 galerias de arte transformam-se em opções de visitação, ou melhor, reivindicam a obrigatoriedade da visita. Assim se revive a história, desde a pequena Santa Fé de Bogotá, nascida em 1538. De Bogotá a 40 minutos de carro, uma visitinha ao restaurante Andrés Carne de Rés, localizado na cidadezinha de Chia, uma espécie de rota necessária a quem visita a Colômbia e, especial, Bogotá. A frente deste restaurante, um misto de empresário e artista plástico, Andrés Jaramillo. Gostosamente saciado, verifico que preciso seguir visitando o país. Próximo destino, Cartagena.
     Ao chegar, sobrevôo uma cidade à beira-mar, com cerca de 1 milhão e 100 mil habitantes, com contrastes de casario extremamente simples e arranha-céus com até 48 andares. Na zona portuária, derramam-se obras para todos os lados. Containeres coloridos, sobrepostos por entre navios no porto, dão maior charme ao cenário. Mas as imagens do cinema resistem e me aquietam no passeio por entre os românticos sobrados. Palmilho e chão de pedra, observando as varandas forradas de flores e as praças arborizadas, povoadas por casais enamorados que se aconchegam como que monumentos vivos à beleza do amor e da cidade. Revejo Garcia Marques no seu Amor em Tempo de Cólera situado por entre as muralhas de Cartagena, cenário para a filmagem da história de Florentino Ariza e Firmina Daza. Supreendo-me com a sensação de conhecer todos estes detalhes com certa intimidade.
         Saindo de Cartagena, vou ao arquipélago colombiano de San Andrés e Providencia. De princípio, me encanta a exuberância da natureza, conformada nas belas nativas, na transparência e na variedade de cores da água e no frescor dos coqueirais. As ilhas todas tem seu o encanto e o meu deslumbramento recupera o cansaço da viagem dos dias anteriores. Entendo ali porque holandeses, espanhóis, ingleses e piratas disputaram este paraíso por longo tempo. Os ingleses tomaram conta até o século 19, quando um tratado decidiu que o arquipélago ficaria com a Colômbia. E, claro, num lugar com tanta história, outras estórias compõem a sua riqueza. Não raro, sou informado de tesouros que foram recentemente desenterrados ali próximo, na praia mesmo. Na maioria das vezes, o que se conta é que tais tesouros teriam sido postos ali pelo legendário Henry Morgan, pirata galês que esteve à frente das disputas pela posse do lugar. Após usufruir de outros confortos, sinto uma vontade imensa de ficar por ali, mas sei que tenho de seguir adiante. Desta vez, vou a Letícia, no meio da floresta amazônica.
      Chego à cidadezinha de cerca de 40 mil habitantes enfrentando as dificuldades de acesso comuns a todos os lugares que ficam na selva amazônica: através de barcos e vôos em pequenos aviões. O nome Letícia dado a cidade tem origem rodeada de controvérsias. Tanto poderia ter sido motivada por uma homenagem prestada pelo engenheiro Manuel Charón a uma peruana chamada Letícia Smith, quanto por iniciativa de um soldado colombiano apaixonado por uma índia que tinha este nome. Apenas uma avenida separa a cidade de Letícia, da brasileira Tabatinga. São os nomes das empresas em idiomas diferentes que marcam para quem chega a informação de que se está no Brasil ou na Colômbia. Entre as várias etnias indígenas da região, predominam os ticunas.
         Ainda não inteiramente satisfeito com o que desejo conhecer em Letícia, sou obrigado a interromper a minha estada pela comissária de bordo que insiste que eu retorne o assento a posição vertical, anuncia que estamos chegando a Teresina. Olho para ela e lembro de sua determinação ao arrancar a bolsa dos braços da senhora sentada na poltrona à minha frente. Acho melhor repor a revista ao seu lugar inicial e fazer como a comissária manda.

2 comentários:

  1. Eu li este mesmo exemplar da revista da Gol, entre Curitiba e Teresina. Deixei em C. Maior. Laerte, só acho que, dali, daria pra empresa tirar um pouquinho mode melhorar o "lanchinho" num país do tamanho do Brasil. Não é fácil, amigo, voar quase 4 mil km sustentado por mini pacotes de mini bolachas com um ou dois copos de refri água com o sabor que está escrito. Se pelo menos tivesse um álcoolzinho pra enganar a fome e o medo.... rsrs
    Tudo bem contigo, Laerte? Seja bem vindo ao grupo de 280 milhões de blogueiros! Teremos a versão paranaense do Encontro que houve mês passado em S. Paulo.
    João de Deus Netto, designer gráfico, caricaturista e blogueiro campomaiorense radicado em Curitiba.

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  2. Pois é, João. Foi-se o tempo em que uma companhia de aviação se arriscava a divulgar uma campanha publicitária cujo apelo era "a melhor distância entre dois pontos". O serviço de bordo tinha até opção. Mas, de qualquer modo, estou satisfeito porque me valeu a oportunidade de visitar estas cidades colombianas e até a experimentar um restaurante que é referência para quem visita a Colômbia.Fico feliz também por saber que vc leu este texto no meu blog. Grande abraço.

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