domingo, 11 de julho de 2010

DIFUSO


Acompanha-me, desde sempre, um sentimento de que preciso buscar algo que me falta. Este sentimento me conduz a estar sempre em movimento, de um lugar para o outro. Uma amiga observou, certa vez, que eu pareço estar sempre de partida, mesmo quando acabo de chegar. Ainda assim, dou comigo há anos vivendo no mesmo lugar. Há uma espécie de contradição, a inquietação move-me para longas viagens e me arremete de volta ao lugar de origem onde permaneço.
Ainda que entre partir e retornar signifique alguns poucos anos, a certeza de que retornarei me põe outro tipo de sensação, a de provisoriedade. Nenhum traço do que pode ser definitivo, por isto mesmo não finco raízes, não estabeleço vínculos permanentes. Nada deve ter marca do ficar. A saudade “de casa” é então aliviada por esta impressão de que logo estarei de volta. Os dias contados, os compromissos parcelados até a data do retorno. O que é provisório não ata laços.
A provisoriedade é real, estamos, como se diz, de passagem na vida. E a sua sensação em mim é uma espécie de equívoco, porque pressupõe a ideia de permanência. Cada estada breve só se justifica porque hei de estar sempre onde estou: em lugares diversos e, ao mesmo tempo, definitivamente, no mesmo lugar. Pode ser que este ir e voltar se faça em função do sentimento de falta, da busca de preencher esta incompletude. Pode ser que este retornar ao mesmo ponto de partida se dê, porque os pontos de busca apontam para o mesmo destino. Pode ser tanta coisa.
Quem está em busca de algo, e não sabe exatamente o que é, não sabe também quando ou se encontrará. Pode ser que este não saber traga junto a surpresa como atrativo, pode ser que também seja acionado para não produzir decepções. Mas, ao mesmo tempo, produz uma espécie de cegueira que nos leva a lugares em que nada há, para se buscar, ou, pelo menos, onde nada se encontra.
Há quem diga que este sentimento deve ser preenchido pela presença de Deus, que quem tem Deus ou uma religiosidade firme não precisa andar em busca de outras coisas que tragam felicidade. Mas é também o caso de se perguntar se não já é a fé que nos remete ao mundo e nos impõe a tal busca.
O crescimento de uma pessoa se processa, basicamente, em duas direções: a primeira é o crescimento físico acompanhado pelos hábitos sociais. Este crescimento conduz a que cada um se projete do seio da família onde goza de segurança para a constituição de sua própria realização, o que quase sempre leva à constituição de novas famílias que esta pessoa passa a prover, assumindo responsabilidades que mais a fragilizam do que lhe dão estabilidade. A segunda direção é produzida pelo desenvolvimento do conhecimento e a ampliação do nível de consciência sobre si e a sua condição no mundo. Esta nova perspectiva arremessa o ser num emaranhado de dúvidas e descobertas, que também produz incerteza e instabilidade, embora possa produzir sentimento de prazer e satisfação.
O que traz novamente a impressão de solo firme nas duas situações pode ser realmente a religiosidade. Mas é por crer em algo que nos arremessamos ao mundo e nos consideramos capazes de vencer desafios e superar limites. Novamente, se impõe a necessidade de ir em busca de objetivos e metas e de se chegar a destinos que não parecem se efetivar nunca. Tenho trabalhado, neste sentido, a ideia de que todo lugar de chegada é, antes, um ponto de partida.
Outro aspecto desafiador é que os percursos se bifurcam e os destinos se multiplicam, o que nos leva a ter que fazer escolhas, a optar. Escolher é necessário, mas nem sempre é fácil. Consideramos que temos direito a escolher, no entanto, quanto mais opções, mais difícil. Escolher um destino é excluir outros. Estes podem depois nos faltar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário