segunda-feira, 5 de julho de 2010

PAISAGENS DA ESTRADA


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Seis horas da manhã, o sono ainda acarinha o corpo, apesar da noite bem dormida. É hora de botar o pé na estrada. O risco largo sobre o chão, uma tarja cinza, a estrada rasteja mundo adiante, um vácuo que suga os desejos de irem-se. Sem que se definam as condições do tempo, o carro revisado e a bagagem pronta determinam que se parta.
No percurso, outros carros não tão apressados vigiam a faixa contínua e impacientam, animam o estresse. Uma curva à frente, um aclive mais acentuado. Tudo é motivo para retardar a ultrapassagem. Só no estirão das retas, nas faixas seccionadas o carro dispara e ultrapassa um após outro até que a pista livre se estire a perder de vista.
Placas de sítios vão ficando para trás, a paisagem vai se modificando de um lado a outro da estrada. As placas indicativas ora entortam mais à esquerda, ora mais à direita e os quilômetros a percorrer reduzem rapidamente, mas parecem intermináveis. À esquerda, avista-se um flamboyant de fronde vermelha, inclina-se sobre flores espalhadas ao chão e adornam uma casa simples, de taipa, porta e janela. Um cachorro estica a língua e se espicha à sombra. À direita, uma cerca branca, e um portão largo contornam uma chácara rodeada de plantas e flores. Palmeiras ao vento.
Um caminhão pesado e longo segue com vagar, pisca a lanterna esquerda indicando que não há condições de ultrapassagem, logo a seguir desliga a lanterna esquerda e aciona a direita, comunicando então que já não mais há risco: ultrapassagem segura. E lá se vai... pé embaixo.
Adiante, à direita, uma boiada margeia, tangida por vaqueiros que se agitam com a aproximação do carro. Aboiam, gritam, aciona o chiqueirador. O gado inquieta-se, mas segue à margem. Por via das dúvidas, é aconselhável reduzir a velocidade e evitar que, num ímpeto de atravessar a pista, tenham-se que adotar manobras ou freadas bruscas. Aos poucos, retoma-se a velocidade de antes e um suspiro profundo finda a apreensão frente ao estirão adiante. Vez ou outra, um jumento, cabras, uma vaca com bezerro atravessam a estrada e tem-se que ter cuidado, alivia-se o pé no acelerador e, quando necessário, aciona-se o freio no tempo e com a precisão que cada caso exige.
Entre os meses de junho e outubro, é comum que o verde ou o cinza que recobre as margens da estrada seja pulverizado por ipês amarelos, que mais se aproximam ou se distanciam, num jogo paisagístico que anima a alma dos viajantes com deslumbramento. Aqui e acolá, atravessam-se pequenos povoados e sedes municipais, onde o desenho das casas residenciais e comerciais é quase sempre muito parecido, como estivesse andando em círculos e passando pelos mesmos lugares diversas vezes. Mudam somente o relevo, as curvas, as retas, o cruzamento com trilhos desativados da ferrovia etc. Mas o melhor indicativo são as placas que dão boas vindas ou, simplesmente, identificam cada localidade.
De um lado ou de outro, crianças oferecem melancias, jerimuns, farinha, feijão, artesanatos da região ou animais silvestres à beira da estrada. Quando é tempo de ata ou milho verde, é quase obrigatório que se pare. A negociação não é fácil, porque na maior parte das vezes o preço está acima do que vale a oferta. Mas, fechado o negócio, retorna-se à viagem com a mesma determinação.
As placas agora confirmam a proximidade com o destino que se aproxima. A tensão vai se aliviando e a velocidade reduzindo-se, também porque aumenta o trânsito e o cuidado tem que ser redobrado.

Um comentário:

  1. Caro amigo Laerte, amei essa paisagem, e como sou editor de uma Revista interna de minha Igreja, aqui em Valinhos-SP. Gostaria de ver contigo se poderia usar essa imagem de estrada em nosso Informativo. Caso positivo, poderia me enviar a origianl, pois para publicação impressa tem que ter maiore resolução.
    Grato pela atenção
    J.Matos
    figueira@nazarenovalinhos.com.br

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