sábado, 27 de março de 2010

O PERCURSO DO PROFESSOR


Final de expediente, o professor Pedro, chefe do Depto. do Curso de Psicologia, busca em suas gavetas a pauta que preparara para a Assembléia Departamental do dia seguinte. Ergue a cabeça ao perceber que alguém entrara em sua sala. Trata-se do professor Josué, um colega de Departamento, catedrático da disciplina Psicologia Clínica.
Cumprimentam-se. O prof. Josué interpela então o chefe do Departamento acerca do resultado do concurso público recém concluído em que foi aprovado um egresso do curso, agora, prof. Orlando. Manifesta desagrado que este senhor tenha sido aprovado como professor, em regime de Dedicação Exclusiva, para o Curso de Psicologia. O prof. Josué tem uma formação militar, conservadora, e não admite que Orlando, que passou, segundo ele, 10 anos para concluir o curso seja agora seu colega de Departamento. Relata brevemente a trajetória do aluno Orlando no curso. Diz que ele até demorou mais que 10 anos para se formar em psicologia porque sua maior dedicação eram as atividades do partido político em que milita, inclusive, a de conquistar mais militantes e simpatizantes.
De princípio, o prof. Pedro ouve com bom humor aquelas reclamações que lhe parecem intempestivas. Explica que ele não pode fazer nada porque foi constituída uma Banca Examinadora reconhecidamente idônea e que uma vez submetido à tal banca e aprovado não lhe resta outra alternativa a não ser encaminhar os resultados setor competente da Universidade para que Orlando seja contratado.
Aos perceber que o processo era, então irreversível, o professor Josué começa a levantar o tom da voz, vai-se irritando e falando cada vez mais alto e em todos os seus argumentos, põe a culpa no Chefe do Departamento. O prof. Pedro, imaginando que vai conseguir acalmar o seu colega, sugere que ele compareça à Assembléia Departamental que será realizada no dia seguinte e tente convencer aos demais colegas que o resultado do concurso deve ser revisto por conta da história discente do prof. Aprovado.
Como o prof. Josué não simpatizava com os debates comuns às Assembléias Departamentais, quase nunca comparecia, entendeu que aquilo era uma indireta para forçá-lo a comparecer à próxima. Pensando deste modo, deu um soco na mesa e gritou que fosse respeitado. Citou toda a sua história de dedicação acadêmica e garantiu que de modo algum iria comparecer àquela Assembléia.
O prof. Pedro perdeu a paciência e, olhando fixo, para a cara do seu interlocutor, falou pausada e firmemente que não tinha autoridade para modificar o resultado do concurso, não era esta a sua atribuição, que não tinha culpa e que não iria mexer uma palha para contrariar a decisão da Banca Examinadora. E, completou, que se o prof. Josué insistisse naquela história e naquele tom, só lhe restaria lhe dar uns murros e quebrar a sua cara. Por fim, perguntou, ainda do mesmo modo, o que, então, o prof. Josué iria afazer?
O prof. Josué ficou lívido. Pensou um instante, fez menção de sair e, voltou-se de repente para o colega que o fixava já de pé. Então, procurou manter um ar de calma e, no mesmo tom, pausado e firme, retrucou que, já que era daquela maneira, pouca coisa lhe restaria fazer: iria para casa com a cara quebrada e quando, chegando em casa, a sua esposa lhe perguntasse quem teria feito aquilo ele diria simplesmente que fora o finado prof. Pedro.

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