sábado, 10 de outubro de 2009

UMA HISTÓRIA DE AMOR




O casal apronta-se para ir à festa, cada um em quarto diferente. Uma festa de família, um casamento entre amigos, numa localidade próxima. Ele, em sua magreza, tem que ficar subindo as calças porque o cinto não aperta a cintura e deixa a calça folgada, insistentemente. A blusa branca, a calça preta em pano passado.
Ela veste uma saia pregueada na cintura e solta na barra, pano fino feito cetim. Blusa de manga, com botões abundantemente enfileirados de cima a baixo. Batom leve e mais nada no rosto. Olha-se no espelho, pela última vez, mais uma vez. Um respingo de perfume na articulação de braço e antebraço, no avesso da mão e na ponta da orelha. Ergue o nariz e tenta colher no ar se não se deixou exagerar. Confirma seu gosto e dirige-se à sala onde ele a espera com impaciência. Ao perceber que se demorara além do devido, baixa a cabeça e comenta alguma coisa sem que se possa ouvir claramente o que seja. Ele se esquece que está aborrecido e pergunta o que ela teria dito ao que ela responde com um “nada não”, já risonho.
Ao chegarem ao local da festa, casa de sítio com amplos alpendres e o espaço invadido com a música alta e luzes enfileiradas até depois dos limites do terreiro. As mesas espalhadas parecem todas ocupadas. Ela suspira fundo a olhar para um grupo de rapazes postos logo adiante. Num olhar, ele a censura e, ao mesmo tempo, indaga onde poderiam se instalar. Ela, embora sentindo aquele olhar, minimiza, diz que não veio à festa para ficar sentada, quer dançar. Puxa-o para o salão onde o sanfoneiro rasga o fole e os dançantes gastam os sapatos no piso encerado.
Dançam até cansarem-se. Saem do salão e buscam algum lugar aonde possam conversar e ficar à vontade. Sentam-se num tronco de árvore afastado do burburinho e põem-se a conversar. Logo, ela percebe que o lugar ganha movimento e, mais ainda, movimento de mulheres. Observa que as moças que por ali passam voltam a agruparem-se adiante e ficam rindo, conversando e a olhar para onde está o casal. Sem mais nem menos, ela pede a ele a aliança. Ele, a princípio, não entende. Ela diz que quer, simplesmente, que ele entregue a aliança e vá conversar com as moças que não fazem questão de esconder o interesse nele. Afinal, diz ela, elas o estão paquerando desde que saíram do salão de dança.
Ele entrega a aliança, beija as mãos da mulher e vai ao encontro das moças que estão logo ali, em pé, falando e sorrindo, ao tempo em que olham para onde o casal está.
Ela sai caminhando devagarzinho em direção a casa aonde a festa vai animada. Encontra-se com alguns conhecidos que perguntam pelo marido. Ela responde que ele foi a algum lugar e prossegue seu destino. Mais adiante encontra umas amigas, cumprimentam-se, trocam algumas palavras e aos poucos um grupo maior está formado. Passam a botar o papo em dia, há muito não se vêem.
Sem que se dêem conta, as primeiras luzes do dia começam a surgir. Ela olha para onde havia vindo e não vê o marido e nem as moças que estavam com ele. Resolve então, ir a busca dele com o objetivo de irem para casa, a festa está quase terminando e ela não se agüenta mais de sono. Percorre quase todo o espaço aos arredores da casa e não o encontra. Resolve procurar dentro de casa e nada.
Quando já estava quase decidida a tomar o caminho de casa sozinha, vê um casal afastado, bem afastado da casa. Ao se aproximar ela o identifica. Caminha, então, na direção do casal e chegando ao local, percebe que os dois estão bastante à vontade em afagos e carícias. Ela para junto e eles nem percebem. Ela, sem alarme, pega na mão do marido e o puxa para si. Ele também não reage. Com calma, ela mostra para o dia que está nascendo e diz que está na hora de irem para casa.
A moça adota uma expressão de surpresa e desapontamento. Sem entender nada, vê como ele cede ao convite da mulher que acabara de chegar ali. Olha para as suas mãos no momento em que ela repõe a aliança no dedo do marido. Desesperada, corre aos prantos em direção a casa. O casal vira-se de costas e se vai impassível.

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