domingo, 13 de novembro de 2011

A PROVA




Satélites patrulham o espaço.
E eu me movo como passo:
entre a província e o mundo.
                              Elias Paz e Silva

          Confesso que não estou muito a fim de fazer a prova hoje. Vou à aula porque tenho que ir, não sei bem como estão as minhas faltas, não posso arriscar a ficar reprovado. Até que eu estudei o bastante para fazer uma boa prova, mas não gosto de fazer provas, esta é que é a verdade.
          Vou-me agora aproximando do Centro Acadêmico, vejo que todos os meus colegas de turma estão lá. De cara, noto que algo está errado: primeiro porque esta turma não anda junta assim e nem tampouco freqüenta em bloco o CA. Depois, está todo mundo de cara amarrada, como se alguém houvesse feito alguma ofensa séria. Pergunto o que está pegando, me falam que não vão fazer a prova, vão falar para o professor. Ninguém ali quer fazer a prova. Eu também não estou a fim, mas não falo nada, só escuto. Pergunto por que não vão fazer a prova? Dizem que não tem nada a ver o livro que o professor indicou como texto: o autor fica falando de suas experiências pessoais, e não existe conteúdo para avaliação, ninguém entendeu nada.
          Bom, este não é o meu motivo, até que eu achei o livro interessante. É verdade que os textos estão escritos na primeira pessoa e alguns são auto-elogiosos, mas, no geral, o assunto é interessante e o autor conhece bem, fala com propriedade. No entanto, continuo só ouvindo. Demonstro, com a cabeça, concordar com o que estão argumentando.
          Quando a turma inteira se levanta para dirigir-se a sala de aula, vou junto. Afinal, se houver uma reviravolta, estarei lá para cumprir com a minha obrigação. A turma elegeu uma garota para falar com o professor, uma espécie líder da turma de última hora. Ao chegarmos à sala, alguns minutos de atraso, o professor já está lá. Sobre a mesa, o Diário de Classe e alguns outros papéis que devem ser as folhas de questionário da prova. Sentamos todos em silêncio, a garota senta-se na primeira fila. Sento-me no fundo da sala, um lugar donde posso observar tudo.
          A garota pede ao professor para falar, ao que ele assente com a cabeça. Ela começa dizendo que ela e os seus colegas não estão preparados para fazer a prova. O professor a olha com espanto, e pergunta o que fizeram desde que o livro foi indicado e o texto disponibilizado para a leitura? A garota diz exatamente o que me haviam dito no Centro acadêmico: o autor fala de coisas pessoais, não há conteúdo que possa servir como tema de avaliação...
          O professor faz silêncio, olha a turma com perplexidade, como se esperasse que alguém ali manifestasse alguma opinião diferente ou, quem sabe, pudesse dar uma explicação mais plausível. Silêncio completo.
          O professor, então, toma a palavra e sorri com ironia, começa dizendo que não irá impor uma prova para a turma se esta turma se confessa incapaz de entender o livro que tentou a muito custo ler. Neste momento, a minha vontade foi a de protestar, de soltar os cachorros pra cima do professor. A verdade, é que não consigo. Estou me sentindo humilhado e co-responsável pela decisão da turma e, mais ainda, se não consigo esbravejar é porque também eu concordo, de alguma maneira, com o que diz o professor. Percebo que mais uns dois ou três colegas argumentam que não é assim, que o professor os está diminuindo, mas a conversa não prospera.
          Ficou pior ainda quando o professor pega seu material para se retirar e resolve tomar mais uma decisão. Diz ele que não haverá mais nenhuma prova, que as notas até ali atribuídas serão somadas com a nota do seminário que deverá ser apresentado em dias previamente marcados, donde será tirada a média para cada um. Outra coisa – completa o professor – ninguém mais precisa entregar o artigo que teríamos que produzir, que seria uma violência exigir que escrevêssemos um artigo científico. Disse isto e retirou-se.

Um comentário:

  1. Rayana, fico muito agradecido por suas palavras. Volte sempre e recomende o blog para as pessoas que você gosta. Grande abraço.

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